segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Pedro Henriques. "Não é vulgar, mas há árbitros que choram"

"Um árbitro fica preso ao erro o resto da vida", diz o militar. Mas a solução poderá ser o vídeo?



Pedro Henriques costuma andar de um lado para o outro a correr atrás da bola e dos jogadores. Não gosta de apitar muito, defende o estilo inglês e os seus jogos tendem a tornar-se rápidos e emocionantes, o que tanto lhe serve de elogio como de crítica, porque está mais perto do risco e do erro. Agora anda de um lado para o outro, nas rádios e nas televisões, a defender a introdução de novas tecnologias no futebol. Foi um dos subscritores da Petição pela Verdade Desportiva, lançada por Rui Santos, porque quer defender o jogo e os árbitros. "Há um que vai ficar eternamente conhecido como o que levou a França ao Mundial." Defende a ajuda do vídeo, mas a revolução não se ficaria por aí. "Estendia a linha de fora-de-jogo, que está no meio-campo, para esticar o jogo."

Acredita mesmo que pode mudar tudo?

Uma coisa é o que pensamos, outra é a realidade da FIFA e aquilo que diz o Internacional Board. São resistentes à mudança, temos consciência, mas isso não implica que quem está por dentro não vá lutando. A petição apresentada esta semana resulta disso e um dos grandes objectivos é provocar esta discussão que aí anda, quem sabe fazê-la chegar oficialmente à FIFA, através da FPF.

Agora fala-se essencialmente no recurso ao vídeo, como se fosse a solução para tudo. Concorda que também nunca será uma solução perfeita?

Claro, não há soluções perfeitas, pelo menos enquanto houver um ser humano a olhar para a imagem e a decidir. O vídeo é uma solução imperfeita, que, no entanto, seria fundamental para ajudar a julgar pelo menos três situações concretas, aquelas que geralmente provocam mais polémica: foras-de-jogo, penáltis e cartões vermelhos. É principalmente por aqui que os árbitros são julgados. Há muitas decisões que podem ser melhoradas - toda a gente se lembra da recente mão do Thierry Henry que pôs a selecção francesa no Mundial. É um bom exemplo do que se pode evitar.

Mas haverá uma consequência negativa que vai contra a génese do jogo: as interrupções constantes.

Veja o caso do ténis: cada jogador tem a possibilidade de interromper o jogo e pedir a intervenção do árbitro três vezes. E que tal fazer o mesmo no futebol? Cada equipa podia pedir a interrupção e a ajuda do vídeo umas duas ou três vezes. Qual seria o problema? Hoje um jogo de futebol tem uns 25 minutos de tempo útil em cada parte, perde-se muito mais tempo com outras coisas. Lembro-me do lance polémico na final da Taça da Liga, entre Benfica e Sporting: foram precisos dois minutos para resolver a confusão. Com o vídeo seria resolvido num instante.

Que diferença faria o vídeo no Benfica-Sporting (2007-08), em que o Pedro Henriques anulou uma decisão do seu auxiliar quando ele marcou penálti? Ambos viram o lance, mas tiveram interpretações diferentes (mão na bola ou bola na mão).

Com o vídeo pode acontecer exactamente o mesmo, uma interpretação diferente que não é necessariamente a mais correcta. Com o vídeo demorava menos tempo a decidir, não tinha de parar o jogo para ir falar com o meu auxiliar. Nessa altura tínhamos os intercomunicadores há pouco tempo, não estávamos habituados à comunicação, e tive de ir falar com ele. Se houver vídeo, é claro que não será o árbitro que vai deslocar-se para ver a imagem.

Insistimos: a televisão pode nunca desfazer a dúvida.

Claro, mas veja o exemplo do râguebi. São três pessoas a decidir, número ímpar para nunca haver empate. No futebol, é claro que não podia ser apenas o quarto árbitro a ficar com a responsabilidade de observar o vídeo. De resto, no limite, em caso de dúvida a última decisão seria sempre do árbitro. Mas devo lembrar que não estamos a falar do recurso ao vídeo por tudo e por nada, mas antes para esclarecer casos como o célebre golo de mão do Ronny, ou o que aconteceu agora com o Henry. Um árbitro fica preso ao erro o resto da vida. Há um árbitro que vai ficar eternamente conhecido como aquele que levou a França ao Mundial, vai falar-se disso agora, daqui a uns meses, quando chegarem à África do Sul, sempre!

É verdade que há árbitros que choram?

Houve um Estrela da Amadora-Benfica, jogo arbitrado por Duarte Gomes e no qual eu era quarto árbitro, em que um dos auxiliares indicou uma grande penalidade que permitiu a uma equipa [o Benfica] chegar ao prolongamento e depois discutir a vitória e ganhar. Esse penálti foi mal assinalado e teve influência no resultado. No final o assistente percebeu isso e ficou desfeito em lágrimas.

Acontece muito aos árbitros?

Não vou dizer que seja vulgar, mas há árbitros que choram. E há muita gente que fica triste quando vai para casa e percebe que errou.

O que mudaria mais no futebol?

Tenho algumas ideias: cantos curtos, para quando a bola saísse pela linha de fundo, dentro das linhas da grande área; não concordo nada com o uso da mão (o futebol separou-se do râguebi há muito tempo) e os lançamentos passariam a ser feitos com o pé, criando mais situações de perigo; o cartão azul, como suspensão temporária para um jogador que já foi advertido, anterior ao cartão vermelho; estendia a linha de fora-de-jogo, que está no meio campo, para esticar o jogo; não parava o jogo para fazer substituições; e mudava as assistências aos lesionados com o jogo a decorrer: de certeza que haveria menos jogadores deitados na relva.

E tornava os árbitros profissionais?

Seja qual for a profissão, um profissional ganha nove em dez vezes a um amador. E isto independentemente do uso das novas tecnologias. Para se evoluir é preciso apostar na competência, e para isso é preciso tempo e disponibilidade. O nível em Inglaterra subiu muito com a profissionalização.

De Inglaterra veio há pouco tempo um estudo que dizia que os árbitros portugueses nas competições europeias apitam mais pelas equipas da casa que os restantes. Os árbitros portugueses são caseiros? Têm qualidade quando comparados com os de fora?

A estatística vale o que vale, se calhar as equipas da casa atacam mais e sofrem mais faltas. De resto, não tenho dúvidas quanto à capacidade dos árbitros portugueses, estamos entre os países com mais árbitros internacionais, nem sequer a Inglaterra nos supera. Desde Agosto tivemos mais de 50 nomeações para jogos da Champions e da Liga Europa, sem notas negativas. E isto com observadores de fora, que é para não dizerem que há por aí compadrios. Temos um árbitro internacional pré-convocado para o Mundial [Olegário Benquerença] e tenho quase a certeza que teremos um árbitro a apitar no próximo Europeu.

A si só lhe faltou ser internacional?

Quando cheguei à primeira categoria sabia que já ia tarde, tinha 36 anos e a idade já não me permitia...

Apareceu a apitar à inglesa, a deixar jogar mais que o habitual. Foi elogiado, mas depois daquela época 2007/08, em que ficou mal classificado, perdeu um pouco a coragem e mudou a forma de estar em campo...

2008 foi um ano difícil para mim. O meu pai teve uma doença fatal, passava os dias entre casa e o hospital... Claro que nada disso foi desculpa, mas acho que continuo a apitar da mesma forma. Sem dúvida que fui evoluindo ao longo dos 20 anos que tenho de arbitragem. De resto, os meus jogos continuam a ter umas 25 ou 26 faltas.

Apita-se muito em Portugal?

Não sei se se apita muito... O que acontece é que os árbitros se defendem através do apito, param o jogo ao primeiro contacto porque assim é mais fácil controlarem os acontecimentos. Mas às vezes quando não se apita lá vêm os críticos dizer que o árbitro esteve mal...

Mas esse não é outro problema? Os árbitros não se deixam pressionar de mais pela crítica?

Pois... Há quem diga que não liga a isso, ou que não lê jornais, mas no fundo todos se preocupam. Depois é uma questão de personalidade: ou se deixam influenciar e abater ou não.

Fonte: I

3 comentários:

Anónimo disse...

e há adeptos que choram ou até se riem com as prestações que muitos árbitros nos presenteiam nos fins de semana.

Macieira disse...

e ha arbitros que erram claramente, so eles fecham os olhos...

Fábio Ferreira disse...

Deve ser por causa das lágrimas que lhes tapam a visão...