sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

"Na qualificação não tivemos o melhor do Mundo" - Carlos Queiroz

A entrevista de Carlos Queiroz em exclusivo a O JOGO começou ainda no Brasil, aquando da presença do seleccionador nacional num fórum internacional de treinadores, onde deixou uma excelente imagem, e foi actualizada ainda esta semana, depois da lesão sofrida por Pepe. Ao longo da conversa manteve sempre um discurso ambicioso, próprio de quem quer levar Portugal muito longe na África do Sul


Brasil, Costa do Marfim e Coreia do Norte são os três adversários de Portugal na primeira fase do Mundial'2010. Nada que tire o sono ao seleccionador nacional. Existe o respeito pelos adversários, mas sem receio de jogar contra os melhores.

Em entrevista exclusiva a O JOGO, Carlos Queiroz faz um balanço de uma caminhada difícil, responde aos críticos, aborda algumas questões do momento e lança o futuro da equipa.


Depois da realização do sorteio, ficou mais ou menos optimista?

Qualquer que fosse o sorteio o meu estado de espírito seria o mesmo. Primeiro, o mais importante é estarmos no campeonato do mundo, desfrutarmos deste momento, pois estamos entre as 32 melhores equipas do mundo.
É um momento especial para nós. Temos de nos preparar bem, porque temos uma causa e uma missão a cumprir. Temos de estar todos juntos nesta prova. Temos de estar concentrados no primeiro jogo, contra a Costa do Marfim. E só depois iremos preparar os dois jogos seguintes. Se queremos ser os melhores, temos de jogar contra os melhores.

Alguns números indicam que Portugal tem cerca de 500 mil jogadores, o Brasil tem cerca de 13 milhões. Como é possível lutar contra esta evidência?

Não sei onde estão os 500 mil jogadores. Os números oficiais da Federação Portuguesa de Futebol são cerca de 130 ou 140 mil jogadores.

Havendo uma diferença tão grande, é legítimo exigir a Portugal que ganhe ao Brasil?

Aquilo que exigimos do futebol é sempre uma aventura, é sempre uma loucura. Mas são uma aventura e uma loucura extremamente atraentes. O dinheiro fala em futebol e os números, quando são tremendos como esses, também falam. O Brasil exporta, por ano, uma média de 1000 ou 1200 jogadores profissionais para todo o mundo. Isso dá-lhe uma profundidade de soluções, à parte a valia técnica dos seus treinadores e dos seus jogadores. É por isso que o Brasil conquistou cinco campeonatos do mundo, e também é por isso que a Argentina tem dois títulos mundiais e a Itália tem quatro.

Tendo um campo maior de escolha, essa quantidade pode ser determinante?

Em futebol a quantidade não é sinónimo de qualidade. Portugal já provou isso. Já foi campeão do mundo duas vezes no escalão de sub-20. Sei que há sempre pessoas que gostam de desvalorizar esses factos, mas em futebol ou noutras áreas, quando estamos bem preparados temos condições de competir. Se vamos ganhar ou não, é outra história, mas podemos competir. Uma coisa é certa: se não tivermos uma preparação ambiciosa, se não tivermos a ambição de ser primeiros, se não tivermos a ambição, a atitude e a postura de exigir o máximo de nós próprios, nunca vamos chegar lá. Podemos não chegar lá, mas onde temos de ser campeões do mundo é nas exigências que pomos a nós próprios. Não neste estado de espírito de pensar que as coisas acontecem porque somos imbecis ou porque tivemos sorte. Isso não é verdade. Queremos estar bem preparados para quando chegar o jogo contra a Costa do Marfim podermos ganhar. É nisto que nos vamos concentrar. Nos detalhes, na preparação, nas viagens, na alimentação, treinar bem, esperar que os nossos jogadores estejam em forma.

É a enorme diferença no campo de recrutamento entre Portugal e o Brasil que leva a Selecção Nacional a ir buscar "reforços" ao Brasil?

Não. Hoje há um mundo diferente, moderno e aberto. Diria que o mundo nunca foi tão nómada como hoje. Portanto, esta multiplicidade de identidades, de afirmações existem por todo o lado. Isto aconteceu um pouco por todo o lado e em todos os desportos. Hoje vê-se isto no futebol, no voleibol, no andebol, no basquetebol e no atletismo. O mundo não pára. Podemos é dizer se gosto ou não gosto, mas isso é diferente, é outra história

E o seleccionador nacional, gosta ou não?

Gosto do mundo em que vivo. Não quero viver do passado. O passado para mim é uma história que deve existir para nos dar experiência, maturidade e conhecimentos para as melhores decisões no futuro. Na vida quem só olha pelo passado e presente perde o comboio do futuro. Temos de ter uma visão modernista, saber antecipar o futuro, perceber as tendências das sociedades e dos futebóis de todo o mundo. Temos de acompanhar tudo ou então entrar na reforma. Eu não quero isso, quero estar no topo da montanha, no topo do mundo. Neste momento temos de festejar a qualificação. Caramba, todo o Mundo tentou a qualificação e muitos não o conseguiram. Temos de festejar a qualificação, mas não celebrar, porque não ganhámos nenhum título e não temos nenhuma medalha. Mas o que não podemos fazer é repousarmos sobre estes sucessos complementares e esquecermos o futuro.

O que pode ser feito?

Para lançarmos o futuro temos de saber tirar partido das classificações anteriores no Europeu e no Mundial, onde fomos quartos, desta nova qualificação para o Mundial e do facto de sermos quintos no ranking da FIFA. Não posso dormir sobre os resultados e os lucros que cada etapa da vida me dá. Portanto, o povo português gosta de futebol? Sim. Os miúdos portugueses gostam de jogar à bola? Sim. Os portugueses têm qualidades excepcionais para jogar futebol? Sim. Podemos ter mais campos para treinar? Sim. Podemos ter melhores treinadores? Sim. Podemos ter uma melhor programação para a preparação e formação dos jogadores de elite? Sem dúvida. Podemos fazer mais coisas? Podemos. Se há condições, por que não fazê-lo? Ao mesmo tempo que estamos a preparar o campeonato do mundo, estamos preocupados com os sub-17 e com os sub-19. Temos de preparar uma elite de jogadores para que possam estar bem preparados para hoje e para amanhã, porque temos de ser consistentes na vitória. Temos de estar preparados para ganhar, mesmo contra equipas mais fortes, porque hoje em dia os jogadores em todo o mundo estão a preparar-se cada vez melhor. Portanto, só temos uma alternativa, prepararmo-nos melhor.

Fonte: o Jogo

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