sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

José Maria Pedroto – A memória a um retrato quase esquecido (Parte II)

Pedroto tirou o curso de treinador ainda enquanto jogador, tendo sido o primeiro português a integrar a tão famosa Federação Francesa. Aí, viria a apresentar uma tese com os 17 princípios de jogo da sua própria autoria e à qual viria a obter uma brilhante classificação (entre os 87 inscritos, apenas cinco passaram, sendo Pedroto o único português nesse lote).

Mais tarde e já como treinador, era inovador na concepção táctica, na acção psicológica junto de adversários e na disciplina. Diz-se ter sido o primeiro treinador em Portugal a obrigar os jogadores a aquecerem no relvado antes da palestra para o jogo, o primeiro a introduzir preparadores físicos, o primeiro a obrigar os jogadores a alongarem depois de cada treino e, acima de tudo, o primeiro a estudar verdadeiramente as forças e fraquezas dos adversários.

O bom trabalho na formação do FCP levou-o também à selecção de juniores onde, em 1961, venceu o Torneio Internacional da Uefa, agora denominado de Europeu de Futebol. A primeira experiência com uma equipa sénior foi na Académica, seguindo-se o Leixões e o Varzim. Neste último, revelou a qualidade de jogo que se tornaria na sua imagem de marca, sempre com muita posse de bola e virado para o ataque.

A experiência acumulada permitiu-lhe regressar ao FCP em 1966 onde durante três épocas venceu apenas uma taça de Portugal, imediatamente antes de ser despedido. O momento sucedeu quando o presidente do clube, à data, não quis pagar mais sete contos para que a viagem de regresso da Luz fosse de avião. Aí, Pedroto atirou: “Não posso fazer guerra e poupar balas e gasolina”. Ao ser demitido, exigiu uma indemnização de 400 contos, 300 dos quais por danos morais, o que culminou com a lei de proibição de algum dia poder voltar mais ao FCP.

Orientou, entretanto, no Setúbal, onde teve cinco épocas de grande sucesso, com o melhor campeonato de sempre para os setubalenses, para além de ter chegado 2 vezes aos quartos final da taça Uefa. Entretanto, rumou ao Boavista onde foi vice-campeão e onde venceu, ainda, 2 taças de Portugal.

Num certo dia, aquando do seu habitual convívio num jogo de cartas com o “bitaites”, o Valentim Loureiro, o Pinto da Costa, entre outros, o actual presidente do Porto não tardou a convencer Pedroto a regressar às Antas, não antes da Assembleia Geral decidir anular o despacho que impedia o treinador de voltar a ser funcionário do clube. Consumava-se o regresso de Pedroto ao FCP. O primeiro ano serviu para realizar ajustamentos, os quais viriam a possibilitar a conquista do título de campeão português passados 19 anos. No final, o treinador caracterizou o feito como “a ultrapassagem do complexo da Ponte da Arrábida”, numa clara alusão ao fim da centralização de todos os poderes em Lisboa. Neste período, passou a tornar-se famoso por algumas afirmações públicas como “um brasileiro é bom, dois é demais, três é uma escola de samba”, “temos de lutar contra os roubos de igreja no estádio da Luz”, “passámos de pombinhos provincianos a falcões moralizados” ou “quando disse que Mário Wilson era um palhaço, não estava a querer ofender os palhaços”.

Por fim, a soma de carisma e perspicácia de Pinto da Costa e de Pedroto tinha resultado não só na reorganização de todo o futebol, mas também numa estratégia de afrontamento dos rivais lisboetas e de todos os poderes instituídos. Na terceira época no FCP, não conseguiu atingir o “tri”, acabando por descobrir no início da época seguinte que tinha um cancro nos intestinos. Seguiram-se viagens infindáveis a Londres, numa luta inglória que o impediu de se sentar no “banco” a partir da 10ª jornada. Em 1984 recebeu a ordem do Infante do presidente Ramalho Eanes que se dirigiu ao Porto para lhe entregar, pessoalmente, o prémio.

Faleceu passado um ano, não deixando de concretizar o seu último desejo de beber um whisky (através de uma colher) e fumar um cigarro na madrugada desse dia fatídico. Todavia, já não foi a tempo de ver o FCP campeão europeu no final dessa época, equipa com todos os jogadores e métodos implementados pelo “mestre” (como era designado).

José Maria Pedroto foi uma figura cujo fim trágico e comovente não nos leva simplesmente uma lágrima nos olhos, mas sim a engrandecer o orgulho que toda a sociedade lhe deveria prestar, a ilustridade de uma personalidade inigualável, um treinador com uma dimensão de toda uma estrutura e que, passados 25 anos, é um ícone e exemplo para qualquer treinador português. José Maria Pedroto, que muitos ainda procuram imitar, foi um verdadeiro fenómeno, um conceito projectado para o futuro na sua classe e com alicerces no confronto anímico e popularidade seca e «cabrestre» de um clássico matosinhense. Infelizmente, poucas referências encontramos a seu favor, nem uma estátua, uma homenagem, um grande prémio ou uma denominação que preconize a verdadeira e merecida distinção.

“O verdadeiro calcanhar de Aquiles do nosso futebol reside no simples facto de quase todos pensarmos que, quando saímos dos estádios, já não somos profissionais de futebol”

José Maria Pedroto – Faleceu a 8 de Janeiro de 1985



















Jorge Manuel Honório




1 comentário:

Simão Santana disse...

O pedroto veio revolucionar o futebol português... em bocas! Na selecção foi zero! no porto só ganhou dois campeonatos nacionais...isto é que é o grande pedroto? o que será o Mourinho???